11.01.2006

Brothers

Devíamos olhar para as nossas faces remotas. Devíamos olhar os nossos amados. Perde-se o fio que liga um corpo adulto a uma história que começou bem cedo, mal acordámos. As faces serenas, de sorrisos intemporais devem ser um estandarte da pressão saudável para não esquecer. Não se trata de esquecer o amor mas de sentar os sentimentos na palpabilidade de uma expressão, em tons de carinho, de camisolas azuis com ornamentos amarelos, vermelhos e verdes. Trata-se do cabelo escuro e o rosto adocicado de quem olha sinceramente. O olhar sorrido menos fingido de todos. O colarinho vermelho já não mora naquele presente. Vive na recordação. Transforma-se numa panóplia de adereços de espaços psicológicos unidos a uma titubeante expressão corporal. Talvez por anos a passarem como raios indeléveis.
Transporto-vos para os vossos rostos actuais e sei que já não são o que rostos que vos criaram. Transformaram-se mas não vos mudaram o nome. Amamos resolutamente uma vida mas em extractos de diferentes aromas. Capitalizando a emoção transmitida de quadros incomensuravelmente distintos em direcção às vossas faces eruptivas, posso compreender-vos melhor à luz do meu amor. Sem medidores estáticos ou variáveis. Descomprometido Amor. Se agora os vossos silêncios de mármore são dolorosos e a dor um passatempo de exclusão, outrora seriam ilusões e receios do mistério do devir. Se não são os mesmos temos um problema, não o das vossas identidades mas vossas identidades em mim. A integração de uma flor com uma árvore pressupõe cronicidade, ordem, desenvolvimento. Vossas têm isso tudo e a inesquecível amnésia da doçura. Multiplicaram-se em árvores sem recordarem as flores. Vejo flores e vejo árvores e harmonizo um campo. O toque no cabelo, as bochechas de seda, os movimentos inconfundíveis e as expressões paradigmáticas são frutos de verão. Frutos colhidos, ventos passados, novos tempos. A distância é maior, a dedicação a própria arte é intensa. Sem tempo para novos retratos de imensidão temerários, surgem novos gestos infirmando a inocência, colaborando com arrojados golpes de mestre. Modificar o presente com o passado esquecido, ou seja, nadar num rio que foi oceano. Do azul das lágrimas ao azul da beleza do céu, sem esquecer os tons do verde da camisola de lã e das ternuras inexplicáveis. Tudo aqui num pedaço de viagem, sem que o vosso interior perceba, por agora. Não se cede no Amor. Cede-se à vida a adopção da evolução, com finos traços gradualmente delgados.

2 comments:

silêncios said...

pois é... os amores nunca se esquecem. Ficam gravados nos corações e modelam as nossas vidas.
Gostei muito do teu poema, e até me identifiquei com ele, parece uma leitura do meu pensamento e resposta ás minhas angústias. :)
Não páres de escrever, o que tens neste blogue é brilhante!

silêncios said...

http://sussurrodosilencio.blogspot.com/2008/05/verde-l.html